sábado, 25 de fevereiro de 2012

 

Marcha 

 

As ordens da madrugada
romperam por sobre os montes:
nosso caminho se alarga
sem campos verdes nem fontes.
Apenas o sol redondo
e alguma esmola de vento
quebram as formas do sono
com a idéia do movimento.

Vamos a passo e de longe;
entre nós dois anda o mundo,
com alguns mortos pelo fundo.
As aves trazem mentiras
de países sem sofrimento.
Por mais que alargue as pupilas,
mais minha dúvida aumento.

Também não pretendo nada
senão ir andando à toa,
como um número que se arma
e em seguida se esboroa,
- e cair no mesmo poço
de inércia e de esquecimento,
onde o fim do tempo soma
pedras, águas, pensamento.

Gosto da minha palavra
pelo sabor que lhe deste:
mesmo quando é linda, amarga
como qualquer fruto agreste.
Mesmo assim amarga, é tudo
que tenho, entre o sol e o vento:
meu vestido, minha música,
meu sonho e meu alimento.

Quando penso no teu rosto,
fecho os olhos de saudade;
tenho visto muita coisa,
menos a felicidade.
Soltam-se os meus dedos ristes,
dos sonhos claros que invento.
Nem aquilo que imagino
já me dá contentameno.

Como tudo sempre acaba,
oxalá seja bem cedo!
A esperança que falava
tem lábios brancos de medo.
O horizonte corta a vida
isento de tudo, isento…
Não há lágrima nem grito:
apenas consentimento.

 Cecília Meirelles

sábado, 18 de fevereiro de 2012



A tristeza se desfaz
Como a neve em maio,
Como se algo tão gelado assim não existisse.
 
George Herbert, "The Flower"

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012




Disse eu a minh'alma: aquieta-te e deixa
as trevas virem sobre ti,
O que será a escuridão de Deus. ...
Disse eu a minh'alma:
aquieta-te e espera sem esperança
Pois a esperança seria esperança pela coisa errada;
espera sem amor
Pois o amor seria amor pela coisa errada; ainda há fé
Mas a fé e o amor e a esperança estão todos eles
no aguardar.

— T. S. Eliot, "East Coker"